Júlia
Júlia sempre teve amores platônicos. Aos 7 anos, foi um
primo mais velho, que colava em seus cadernos de escola, adesivos do homem
aranha. Júlia achava isso tão legal e juvenil, que passava horas pensando no
primo, desenhando pequenas teias de aranha em tudo que era canto.
Aos 10 anos era um cantor de música romântica, enquanto
ouvia cada verso, tinha a certeza que o dia que ele a conhecesse os dois se
casariam e seria felizes para sempre. Aos 15 um professor de educação física.
Aos 16 um vizinho que nem sabia de sua existência. Aos 17 um que pegava o mesmo
ônibus que ela em toda segunda quinta feira do mês. Aos 18 seu primeiro chefe.
Aos 19 seu médico.
Vivia intensa e platonicamente suas paixões, as pessoas
criticavam mas ela sabia no fundo que nenhum desses romances iam dar em
nada. Jamais se declarou. Jamais trocou
muitas palavras com qualquer um deles. Mas era feliz assim, vivia vida de
sonhadora, não precisava procurar por ninguém, tinha sempre alguém em quem
pensar, e sofria pouco, apenas aquele sofrimentozinho platônico que nossas
paixões platônicas provocam.
Até que um dia, Júlia conheceu Eduardo, sentava ao seu lado
na faculdade. Não era cantor, poeta, professor, não pode nem mesmo ser
considerado bonito. Mas tinha um jeito engraçado de arrumar os óculos, um
insistente não saber o que fazer com as mão, e uma gentileza com todos que
faziam com que ela se derretesse. E era engraçado, fazia Júlia rir, como ela
nunca ria, e o principal, gostava dela, queria sair com ela, namorar com ela,
casar com ela!
Júlia, que até então, só tinha vivido seus amores platônicos,
não sabia o que fazer com esse gostar de quem se pode ter. Se por um lado
encantava o sorriso de Eduardo, cada detalhe impar, cada cheiro, tão
particular, tão dele... Por outro se apavorava, não sabia o que fazer, ela que
sempre amou distante, tinha agora tanto amor ali, na carteira ao lado.
Júlia queria, ficar com Eduardo, queria mesmo. Mas abandonar
o conforto de suas paixões platônicas e inofensivas, se por a prova de um
relacionamento de verdade, era muito desafiador.
Sei que todos
esperam, um final romântico e talvez uma lição, mas diferente das novelas, e
dos filmes, sempre tão felizes e previsíveis, infelizmente com ela foi
diferente, não suportou a pressão. Primeiro trancou a matrícula, depois
transferiu a faculdade. Continuou sua vida platônica, e como é de se imaginar,
não protagonizou nenhuma história de amor.
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